quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Avise-me do começo do filme


(...) Minha avó pedia para avisar quando o filme começava. Confundia o filme com o próprio trailer, não tinha costume de ir ao cinema. Jurava que os resumos de outros títulos já correspondiam à história que iria assistir. Respirava aliviada quando os créditos e o cutucão apareciam; dai colocava os óculos e mergulhava na hipnose das mãos na cadeira(...)
Trecho de Avise-me do começo do filme

Eu me porto assim diante do amor. Preciso do cotovelo dos amigos no meu braço quando ele começa, apesar de ser a protagonista. Não que eu não saiba, terei que confessar: Não sei mesmo! Amor não se sabe, amor se pressente. É uma indefinição contente e, ao mesmo tempo, assustadora. Acontece um descuido quando meu corpo está bem próximo ao dele, é como se existisse algum feitiço na saliva do beijo, um pressentimento longo e duradouro no olhar, uma pressa em se despedir que é desejo de permanecer mais um pouco. O que era para ser passageiro, o que era pra ser mais um esquecimento, o que era para ser mais uma noite pra dormir, transforma-se em obsessão de acordar, cuidar e voltar, em obsessão de estar presente e arrumar todos os motivos e subterfúgios para não pensar em outra coisa.
Aperta uma vontade de conversar sobre a história com todo mundo que se encontra, com o carteiro, com o bancário, com o jornaleiro... e buscar conselhos até na embalagem do chocolate. Falar do amor para que ele aumente ou para que diminua. Para que ele suma ou nos dê a confiança de tomar atitudes improváveis e delicadas.
É uma encruzilhada colocar essa palavra para fora da boca. Abrir-se, expor-se de tal modo que não se pode retornar ao que julgavamos nossa vida, ao que acreditavamos ser nosso lar, ao que confiavamos como nossas convicções e nossa ordem. Como confessar uma paixão e depois fingir que isso não mexeu com a gente e retomar o trabalho e a disciplina dos dias como se fosse comum?
E ai, antes impessoal, o amor agarra-se a um nome e não mais nos pertence. É irrecuperavel porque depende de um sim ou um não. Quando dito, irá embora sem ascenar. Então, não descubriremos que estamos doentes, descobriremos que não temos cura. Amor não nos fortalece, enfraquece. Ficamos indigentes à espera de um beijo, de um telefonema, de uma mensagem. O amor muda o nosso passado!
Sofremos com a incerteza do que a pessoa amada dirá ou fará. Usam-se palavras emprestadas para não ser direto. Encontram-se motivos alheios à verdade para não se entregar. Mas o amor não seria tão sério se não houvesse a possibilidade dele se converter em uma comédia, e a comédia não seria levar um fora, comédia é a covardia de não se declarar e antecipar sozinho os risos que seriam bem melhores acompanhados.

A avó é que conhecia de cinema... O filme já começa bem antes do filme!
Bertha S.

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